Foi uma pergunta que eu me fiz no congresso que aconteceu aqui em Arequipa no último fim de semana. O congresso reuniu membros dos 5 comitês que existem no Peru, incluindo a MCP e toda sua junta diretiva nacional. O trabalho, tal como a maioria dos trabalhos da AIESEC dos que eu tive contato nessa minha estreita empreitada aqui, foi um trabalho de primeira. De primeira para jovens que nao soa profissionais, estao recém comecando uma vida profissional e também tem seus trabalhos fora, sua vida na universidade e tudo o mais. O congresso foi em um hotel, chamado derrama magisterial, em uma parte nobre da cidade. Todos os invitados ficaram o tempo inteiro do congresso hospedados no hotel entre dinamicas, exposicoes, debates, festas e muita bebida, com direito a kissing contest drinking contest e tudo o mais. As exposicoes e as atividades marcadas na agenda, em geral, me pareceram um pouco fracas em termos de conteúdo, com algumas excecoes. Um professor de ética e filosofia ministrou uma sessao sobre o papel da juventude hoje, e como ela está em permanente (re)construcao. Ótima palestra. Desenvolveu com maestria o tema mantendo o pessoal da AIESEC atentos por mais de 1 hora e meia. Um exito indiscutível, diga-se de passagem.
A cena de gala onde aconteceu as premiacoes dos comites e dos projetos foi de muito bom gosto. Escolheram um cardápio simples mas que agradou a todos. Abriram mao das extravagancias peruanas, o que a mim, particularmente, me pareceu algo de muito bom senso por parte deles, levando em conta que parte considerável do público era de outros países. Durante a cena de gala, um senhor chamado Fredy Jauregui, fundador de dois comites aqui no Peru – o da universidade de lima e o do pacífico – fez uma fala muito bonita sobre a AIESEC e as suas impressoes sobre a instituicao hoje. Trata-se esse senhor de um homenzinho taciturno, com fala mansa, e com um espanhol muito bonito. A lá, buenos aires. O problema foi o pós discurso. Conversei com ele sobre os rumos que tinha tomado depois da saída da AIESEC, e de pronto, me choquei. Hoje, é dono de 7 empresas. Entre elas, uma mineradora. Depois fiquei sabendo ainda que é um dos empresários mais ofensivos do Peru e que tem muita grana! Bueno, até aí nao tem problema algum, aliás, qual o problema de se ter muita grana? Pra mim, nenhum. O que me ocorreu, foi uma dúvida que ainda nao consegui encontrar resposta. Será que esse senhor, que em grande medida, deve ter valido-se de todo o conhecimento e networking que adquiriu enquanto esteve na AIESEC o fez de maneira bem intencionada?. Será que hoje ele ainda leva em consideracao e coloca em prática os valores basilares da instituicao tal como consciencia social, sustentabilidade, tolerancia, etc...? Será que tem posicoes sustentáveis com os seus empregados, respeita o meio ambiente, leva a diante toda essa parte romantica – que a mim me parece a parte essencial – da instituicao e todos seus principios? Conversando com o pessoal do CLAQ todos me disseram que esse senhor sempre se manteve muito solícito para com as requisicoes da AIESEC, que sempre quando requerido participou de eventos comentando sua experiencia e de outras mil e uma maneiras ajudou direta ou indiretamente os atuais aisecos. Bom, pra mim isso nao basta. Se esse senhor é um cidadao que tem 7 empresas, que joga milhoes de metros cubicos de resíduos materiais no pacífico, se explora a mao de obra de seus empregados semi-índios, se é um daqueles empresários matemáticos – ditos, ofensivos – que calculam o possível e o impossível para diminuir os custos de producao e maximizar os lucros, ele promoveu nao mais que o inverso que a AIESEC estimula nos seus membros. E aí, entramos em uma contradicao. Uma legítima sinuca de bico. Os valores que a instituicao promove – e o faz muito bem diga-se de passagem – é contrário de muita coisa que hoje é vitoriosa. De que hoje as pessoas chamam, erroneamente, de bem sucedidas decisoes. Acertadas decisoes. Nao consigo imaginar um empresário muito ofensivo guiado por largos sentimentos de sustentabilidade, de educacao ambiental, de respeito a adversidade. Com o perdao do cliche marxista, a adversidade, via de regra, serve a esses homens para producoes mais largas e mais baratas. E claro, melhores lucros. Expansao. Arriba y adelante.
O que me interessa e me instiga, portanto, é saber se a AIESEC nao acaba sendo uma escola de iniciacao à carreira na iniciativa privada. Os seus aspectos organizacionais que lembram claramente todos os aspectos de uma empresa acabam servindo como uma pré-experiencia profissional riquíssima para jovens que mal terminaram suas carreiras na universidade e que, muitas vezes, ainda nao se decidiram o que fazer da vida. E isso me preocupa. Me preocupa a idéia de que a AIESEC possa muito bem ser muito mais uma confortável escola formadora de novos líderes empresariais do que realmente uma instituicoa que promova e estimula esses nobres valores. Valores que enfim, infelizmente, estao renegados hoje em dia, a um longínquo segundo plano. Talvez seja uma decepcao a qual eu deva me preparar.
O meu amigo holandes me disse ontem que eu possivelmente perdi as medidas – ou ainda nao as tomei – e que estou com uma visao muito altruísta da coisa. Que a AIESEC nao foi feita para ajudar os pobres e os desajustados. Bem, ele tem razao. Só o que me preocupa é que tipo de desenvolvimento que a AIESEC quer para os seus membros, e além do mais, o que eles tendem a fazer com esse desenvolvimento adquirido em uma das épocas mais felizes e férteis da vida.
Pago pra ver. Contudo, mantenho sempre o otimismo. Que aliás, nos vem salvando de pequeninas mortes-decepcoes diárias. E convido-os todos os demais a acreditar nos exitos da humanidade em detrimento as monstruosidades perpetuadas pelo tempo.
Belo tópico de discussões pra uma mesa de boteco e cerveja gelada! Me lembra quando estivermos numa...
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